quinta-feira, 30 de junho de 2011

O post do mês de JUNHO

 
O Fabrício Carpinejar, poeta e escritor de Rio Grande do Sul escreve às quartas-feiras no blogue Vida Breve.
No passado dia 8 de junho escreveu uma crónica – ou post – sobre o Primeiro Amor. Sem qualquer tipo de dificuldade elegemo-lo como o post do mês de junho. Merecidamente.

Isso quando não ocorre falha de conexão

Todo mundo que começa a namorar não sabe ao certo que namora.
O início é confuso, entremeado de hesitações e receios e pudores e reservas e uma fileira de sinônimos sofisticados para medo.
Puro medo.
O casal demora a oficializar aquilo que já é público. Não quer melindrar sua companhia, muito menos oferecer motivos para receber um fora adiantado.
Eles se preservam do convívio para não caírem em tentação, recusam bares e festas para conservar o segredo. Estão loucos para contar aos amigos, mas temem que a fofoca estrague a notícia. Há a crença de que alegria espalhada se transforme em inveja.
Eu não sofro mais desse mal. Detectei a encruzilhada, o exato momento em que o namoro vira à esquerda e não tem mais volta.
É quando um dos dois telefona para não conversar. Para não dizer nada, coisa com coisa.
Suportar o laconismo amoroso é uma das torturas mais angustiantes da existência.
Acompanhe meu raciocínio.
No meio do serviço, ela liga. Por ansiedade, você atende ao primeiro toque. Espera que ela fale oi. Mas não. Ela espaça a voz como se fosse uma amante, uma sequestradora, alguém que não protegeu as teclas e acessou seu número por engano. Dá para escovar os dentes até surgir um tremido par de vogais.
Ela não lhe procurou em função de alguma novidade, para dar um recado, testar a temperatura ou planejar um encontro. Suspenda a objetividade, o mundo físico, a matemática, as operações de trigonometria.
Sua futura namorada ligou para suspirar. Compreenda que ela ligou para que você testemunhe o que ela está sentindo, como uma criança que coloca o fone em direção ao mar e jura que a os pais alcançam o barulho das ondas.
Ahhhhh é o som fundador de um papo que não vai acontecer. O telefonema corresponde à sonoplastia da saudade. Prepare-se para variações de um mesmo tema.
— Como você está?
— Meio estranho…
— Eu também…
— Mas é um estranho bom.
— Um estranho feliz.
Um repete o outro, num misto de fragilidade e receio. É um diálogo que medita sobre vazio. Durante trechos inteiros, nenhum fala. Uma conversa exemplar e inédita em que os dois somente escutam. Uma troca de respiros, jogo de vento, intercâmbio de palpitações.
Assim como ela discou sem motivo, o pior vem agora, não há como desligar sem ofender. Depois de quinze minutos de ausência absoluta de som, chega a hora de seguir a vida.
— Você desliga, eu não consigo.
— Não, você desliga, eu não consigo.
— Não, você!
— Você!
— Você!
O amor é uma grande coragem cheia de pequenas covardias.

Publicado por Fabrício Carpinejar em 08/06/2011
  

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