terça-feira, 26 de setembro de 2017

Todos temos uma cruz


Cada um carrega a sua cruz, como escreve Vítor Encarnação na sua coluna “Nada mais havendo a acrescentar...” no Diário do Alentejo da semana transata.
Revejo-me neste texto. Revejo muita gente que conheço.
Com a devida vénia o transcrevo.
«Cada um carrega a sua cruz, ainda ontem chorei agarrado à minha, estava sozinho e é triste não ter com quem falar, há dias mais pesados, há noites que tapam toda a luz, há momentos em que se me tolda a visão e a vida toda fica cega, Deus me perdoe. Às vezes passam-me maluquices pela cabeça, pensamentos que por lá se acoitam e não saem de maneira nenhuma, matuto, matuto, o que eu devia fazer sei eu, há coisas que eu nem digo à minha patroa, tal não seria a dor se eu o fizesse, já lhe bastam a falta de saúde e os desgostos, coitada que também carrega uma cruz bem pesada. Cada um tem a sua, leva-a às costas nesta via-sacra que é a vida, a vida, esse Pilatos que lava as mãos, nos condena e nos leva dia após dia até ao calvário. Quanto mais velhos somos maior é o tormento, mas eu não tenho medo de mostrar a minha cruz, é feita de rugas e memória, já tenho idade para perceber o martírio do tempo, a omnipresença da dor, a inevitabilidade da perda. Ainda ontem chorei agarrado a um cigarro, de cada vez que a cruz me pesa fumo um cigarro e vou à taberna, encontro por lá outros como eu, cantamos umas modas e falamos da mocidade, sinto-me melhor quando não penso, sinto-me mais aliviado quando tiro a cruz de dentro de mim, tiro-a da alma como quem tira uma faca espetada na carne e encosto-a ao balcão enquanto bebo um copo de vinho.»

 

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